sexta-feira, 29 de abril de 2022

E dessa vez, eu matei.

 E dessa vez eu matei


Quem pensa muito sobre a morte, já está morto. E ela me abraça o tempo todo, é quase como se perdurasse em mim, me abraçasse e fosse o desconhecido mais prazeroso que eu conheci. Eu flerto com a morte o tempo todo.

As borboletas no estômago são ansiedades e noites mal dormidas, são pensamentos que flutuam pelo meu mais íntimo ser e eles sempre estiveram aqui. Por vezes, tento imaginar-me agarrando-os com as mãos para sentir cada materialização deles, pois não é possível que seja somente um pensamento… Eles me causam dores, rasgam-me por inteira. Definham-me. São assombrações indomáveis que flutuam a cada cômodo.

Desses fantasmas, eu conheço alguns. Eles são tão cruéis e sombrios que me padecem por inteira. Daria tudo para abrir o meu corpo, perfurar a minha alma e arrancar com as minhas mãos todos eles. Reconstruir-me do zero. Tem muita imensidão turva que eu não deixei entrar, mas que me fizeram de tão mal grado… Mas agora sinto-me como uma bomba relógio em expansão em liberação de todo esse caos.

E são muitos tapumes, muitas ataduras e remendos que coloco em mim mesma para não mais enxergá-los. Fingindo que posso deixar esses fantasmas como souvenirs e mostrá-los desassociados de mim, mas a vida não é assim.

 Estou exausta. Por vezes, imagino-me gritando ao léu. Um grito seco que me fizesse corroer e vomitar para fora toda sujeira que se apossou de mim, para que eu pudesse enxergar um pouco que há de bom aqui dentro. E eu me afasto de quem mais amo, pois tenho tanto medo que elas enxerguem todo esse lodo podre que me faz querer morrer. 

É tudo insustentável.

E tudo sempre teve um pouco de ti e isso me dilacera, me corrói. Para onde quer que eu olhe; te enxergo, as memórias se apossaram de mim e me definham até que eu me perca nessa simbiose irreparável e imensurável de tamanha dor.

Mesmo que eu te colocasse junto aos fantasmas, nessa caixa de minha alma. Você está aqui. E agora é tanto luto para lidar… E eu sinto que se foi, mais um pouco do que me restava de belo.

É tudo insustentável.

E todas as coisas boas que me oferecem eu renego, pois eu preciso que saiba o quanto dói. E tem feridas que não cicatrizam.


E dessa vez, fui eu quem matei.


domingo, 7 de março de 2021

Medos, fantasmas e vícios..

 Não consigo produzir nada.

Tampouco escrevo.


Existe uma neblina caótica acinzentada que permeia todos os meus dias. 

Trago os cigarros como quem traga a vida; ansiando para que as dores inexplicáveis sumam com o vento e se integrem lentamente ao vácuo cósmico desse ciclo constante dos meus próprios dias.

O relógio marca as horas, mas os tempos não ditos se esvaem lentamente sob meus olhos fotográficos, eles não podem ser palpáveis e, ainda assim, pesam uma tonelada. Como um chicote temporal dilacerante e passageiro, suas marcas ínfimas perante o universo tornam-se devastadoras para o ciclo da minha própria existência.

Assim, a reclusão não é apenas uma opção é como uma obrigatoriedade da prisão que me assola.

Aqui nesse estágio encontro medos, fantasmas e vícios que sempre estiveram embrulhados nessa neblina. É como me guiar através de um caleidoscópio e quanto mais eu aproximo os olhos mais embasados eles se encontram.

Entre livros e filmes, entre os dias e as noites, entre conversas e silêncios; existe um papel celofane de todos os meus anseios e temores bloqueando meu horizonte de expectativas, costumo sentir um excesso do presente e ainda que ouso me afastar para analisar os acontecimentos, enxergo uma teia misturando passado, presente e futuro. E nesse caleidoscópio acinzentado, nebuloso e sujo, os sonhos que um dia tive, se dissipam ao vento repleto de toda a toxicidade que eu respiro, mas ainda tem muita aqui dentro. 

Costumo me imaginar gritando ao universo para mostrar que eu existo, mas estou certa disso?

Me agarro em memórias singelas daquilo que um dia ousei me apegar, e "as palavras e as coisas" se vão para o obsoleto encaixe desse ciclo.  Em busca da prescrição de uma cura, bebo o meu próprio veneno na expectativa de um dia ser vista através dos olhos empáticos que enxergam o mundo ao redor. 

Esqueço-me quem sou, definhei com o tempo... E em um último suspiro, tenho o reflexo de tentar agarrar o tempo, seguro em minhas mãos com os punhos cerrados, mas ele escorre como a areia da praia. Como ousar desafiar essa grande ampulheta chamada vida?


segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Carta para a ansiedade...

Bizarramente nunca pensei em lhe escrever, afinal você tem sempre existido em minha vida e me acompanha em tempo integral. Compreendo que sua presença me aflige e por isso acho que provavelmente esta carta também será limitada. Eu poderia lhe escrever uma tese e narrar a guerra interna gerada por ti, mas a sua presença me barrou.
Todas as vezes que penso em lhe escrever eu não consigo, ironicamente começo a ficar ansiosa… Em tantos níveis você vem me limitando. Tornou-se costume desistir antes de começar e de tanto pensar no que tem de ser feito, eu não faço nada.
Sinto que eu tinha tantas possibilidades, o mundo é enorme e sou possuidora de certo potencial, entretanto, paradoxalmente, sou impedida de seguir em frente. Ergue-se sob mim uma nuvem turva, meu horizonte de expectativas é bloqueado com um emaranhado de questões.
    Você não é sólida, mas frequentemente transfigura-se em um bloqueio ou nessa figura turva que me abraça e perpassa a minha vida. É certo que tudo tem uma pitada sua, todos os meus problemas internos parecem vir sobrecarregados de ti. Ultimamente eu me estagnei com sua sobrecarga, duas palavras entraram em constância na minha vida; procrastinação e confusão.
    Ambas são respingos seus. Ambas me limitam.
Todos os dias eu perco um pouco mais do meu potencial, o cansaço mental me submeteu a isso. São noites mal dormidas e horas perdidas em sua companhia... Sinto que cada vez mais a percepção vital das coisas se esvai. É um processo tenebroso e angustiante, a procrastinação é quase uma afirmação da minha exaustão.
Quando reflito acerca da confusão eu sinto que ela é generalizada, desde pequenos pensamentos de epifania até mesmo coisas ditas "conscientes", esse processo conturbado me colocou um véu sobre meus neurônios e fez com que a turvação da nuvem se apossasse gradativamente da minha "caixa mental" e emocional... Como efeito sublime, às vezes -quase sempre- a realidade é confundida, surrealmente tenho momentos que não consigo compreender o que se passa, sou sugada por uma insegurança e não sei associar o que é real ou não... "Eu estou maluca ou isso ta acontecendo?" Quero dizer que; isso me limita também, fico refém dessas sensações e me paraliso na hora de me posicionar ou agir perante as coisas.
Com o auxílio da minha ansiedade percebo que criei um complexo de medo. Essa criação foi moldada gradativamente, desde minha infância - o que a doutora afirma- nesse contexto eu consigo ter a noção semelhante ao que aprendi na faculdade sobre Nietzsche; "a árvore sente mais as suas raízes do que pode vê-la..."
E eu sinto que estou enclausurada nos meus fantasmas, são figuras conturbadas que aparecem efemeramente em átimos de segundos do meu dia... Difíceis de captar mas que abalam feridas não cicatrizadas. No fim, talvez sejamos os nossos próprios fantasmas.
Nessa conturbação orgânica eu me dilacero e vejo o tempo passar,
“Às vezes me perco
Não sei pra onde ir
Aí eu fecho os olhos
Rezo pra não cair
Eu vejo o tempo passar
Parado em meu lugar
Pensando em tanta coisa
Que eu não sei explicar
Eu já cansei
De perder
Destino deu a chance
E eu não consegui ver
E eu já nem sei
Se vale a pena, mais
Tá tudo tão veloz
E eu no banco de trás
Eu quero desistir

Depois não quero mais

Exemplo vivo da falta

Que a coerência faz
Não quero acreditar

Que pra ser mais feliz

Tenho que renunciar

Tudo que eu sempre quis
Eu já cansei

De perder

Destino deu a chance

E eu não consegui ver
E eu já nem sei

Se vale a pena mais

Tá tudo tão veloz

E eu no banco de trás”

No fim existe uma constância na minha inconstância que me torna coadjuvante da minha própria vida.

sábado, 3 de junho de 2017

- Inefável

Eu estava procrastinando e vendo umas fotos do meu celular e acabei por encontrar uma foto sua. Na verdade, para ser bem sincera; estava naquela pasta que eu criei só de fotos suas. A saudade bateu, até que descobri um efeito doido do iPhone que faz a foto mexer e quando eu menos esperei você estava lá, com a mão no rosto e sorrindo ao olhar para mim, você sempre faz isso. Sempre. É sempre o mesmo olhar. Um olhar que penetra e faz as vísceras se estremecerem, faz meu corpo arrepiar todo e meu coração quase explode de vontade de te agarrar com toda força do mundo. Mesmo sabendo que quando eu faço isso a força se esvai, o corpo fica bambo e a única  vontade que eu tenho é de me derreter em ti. Eu juro que consigo visualizar cada parte do meu corpo transpassando a cada parte do seu, e isso tudo em um abraço. Eu não costumo sentir isso, é algo que mexe com o meu lado carnal em um nível tão subatômico que passa a ser algo raro... Porque eu já transcendi meu pensamento quando o assunto é você, o meu imaginário não consigo mais transcrever em papéis, o meu corpo tenta fazer o papel da caneta e transcrever o sentir a partir do meu toque em ti. O seu sorriso me deu combustível a transpor tudo que o seu sorriso me faz sentir.
O que é sentir?
Ontem eu estava conversando com um amigo e ele me disse que as palavras são mundanas, mas o sentir é transcendental... Ele não faz parte do mundo. É indescritível. Veja bem: a gente sente um raio cair, a gente sente a água da chuva em nossa pele. Sentimos. Mesmo que não soubéssemos a etnologia da chuva e do trovão, saberíamos que eles existem pelo nosso sentir. Esse mesmo amigo me contou que essa redução das palavras também depende da nossa cultura, ou seja: da nossa mania de ocidentalizar tudo. Até o sentir.  Depois de uns minutos de conversa notei que ele estava falando sobre Foucault.
Semana passada estava em uma aula em que o professor disse algo sobre as palavras serem genéricas e reduzirem a essência do ser. Pensei muito nisso e conclui que era por isso que eu não conseguia escrever algo sobre ti, por maior que fosse a tentativa e por mais dedicada que eu estivesse em falar, nenhuma palavra mundana me satisfaz. É como se tudo perdesse a essência  assim que é exposto no papel. As palavras são genéricas, são quase um objeto tortuoso, elas moldam o que é permitido e possível descrever e descarta aquilo que não conhecemos cientificamente ao ponto de falarmos sobre.
Eu associei a sua voz. A sua voz é poesia que transborda do seu ser, assim como o seu sorriso, - mesmo memorizado em foto- ela, a sua voz, se sintetiza em minha pele enquanto calafrios remontam o meu ser. Mais do que remontam; me fazem expandir... E então percebo que eu já não sou o que um dia fui. Não tem como descartar você desse meu novo eu, não tão genericamente e vagamente.
Eu sou uma construção geral das coisas que eu sinto, eu sou o que criaram de tão mal grado(2013) mas também sou o que não tiveram a intenção de criar e ainda assim me fizeram expandir... Com sensações subatômicas, sorrisos e poesias musicais.
Você é expansão, também é retração quando não quer ser. Você não se cabe em ti, o teu olhar, o teu sorriso e a tua voz se expandem porquê são sobrecarregados demais para se trancafiarem em ti.
Você  pode ser concreta, mas o teu sentir é como uma supernova: ilumina e faz engolir o que se ousar encontrar.
"30/08/2016
[...] Somos eternos corpos celeste navegando no espaço tempo;
uns são como supernovas que iluminam e engolem tudo o que estiver pela frente, outros;
meteoros em busca de planetas para colidirem e causarem mudanças.
Eu sou como um fluído gasoso; inóspito e inconstante"
... Mas dá pra evaporar e encontrá-lo através do ar [...]
- Gabriela Andrade


quarta-feira, 13 de maio de 2015

- Vezo, Vitiu, Vício.

O ônibus segue a trajetória, a chuva me deixa indisposta. O pingo d'agua é somente uma substância HCO3, mas ao final de tudo se torna proporcional ao meu pranto. Me acho semelhante ao ser que constantemente e inconscientemente balança a perna sem parar. Temos algo em comum: ambos queríamos estar em outro lugar.
Talvez, pelo horário, queiramos a cama. Mas o que pode haver de tão bom em se deitar? Nada. Nenhum problema, nenhum afazer... Quem sabe um livro. Uma história, mesmo que fictícia, mas uma história.
Cheguei ao ápice do texto. Quero uma história.
Mesmo que sofrida e dramática, é sempre necessário poder contar algo a alguém. Os sonhos e as leituras imagináveis não podem ser compartilhadas, já que na certa, infelizmente, se me permite dizer, outrem não queira saber.
É difícil ter mundos idealizados quando se esquece de viver a dura e fria realidade. Ambos são opostos, mas como dizia a velha química; os opostos se atraem. Todos vagam pela rua, seja por meio de ônibus, seja caminhando, todos estes necessitam chegar em casa e imaginar inimagináveis coisas. A realidade, caro leitor, nos entristece e nos faz morrer aos poucos.
É por isso que me identifico tanto com o ser do primeiro paragrafo, ele tem um vicio, mesmo que inconsciente, ele tem. O balançar da perna transmite seu nervosismo constante que, infelizmente, se tornou diário, não mais momentâneo. Assim como o cigarro aceso daquele dia distante, assim como a erva daninha queimando meu corpo.
Agora não sou só carbono, tenho em mim nicotinas, substâncias tóxicas até das verduras que comi ontem para ter a suposta sensação de ser saudável. Não tem como fugir, uma hora ou outrora a gente se mata, se vicia, e vai agravando... E tudo é diário, entrou pra rotina.
Acorda, acende um cigarro, bebe um café, se arruma pro trampo, pega um ônibus, te estressa na estrada e vai trabalhar. Quando chega odeia teu mundo, toma teu rivotril e assiste um filme vagabundo. A casa já não é mais aconchegante, a bagunça da sala é gritante e a sua cama é, de longe, inabitável com todas as roupas mal passadas. Mas é seu único lugar.
E você tira o acúmulo pra acumular mais quando for deitar e ter a falsa percepção de que vive, quando o que mais quer é gritar que não dá. Já basta!
Então o homem do balançar, no meio da noite, acorda. Pensa em assinar aquela carta escrita dias atrás, mas chora como uma criança que não consegue decidir se quer ir ou ficar. O choro é amargo e imperceptível, surpreendente, um novo vicio. Com tanta sobrecarga, pega outra cartela e começa a sangrar. Três vícios.
Numa canção de ninar, fecha teus olhos e transborda no sono. O sono profundo, de um sonho lindo, pra nunca mais acordar.


Temos tanto em comum, meu caro, que fica difícil falar. - Gabriela Andrade.

segunda-feira, 16 de março de 2015

En-ti dade

Manda chuva, Oxóssi.
Eu quero me molhar
preciso de algo que possa me agradar
não quero mais um guarda chuva.

Manda onda, Iemanjá.
Eu quero me banhar
nessas coisas da vida
Até me afogar.

Preto velho, me dê calma
Eu quero ir fumar
Me faz querer sambar
na roda de Madureira ou Irajá

Oxalá, me proteja
pra'que eu saiba nadar
pra'que eu não (r)esfrie
pra'que eu não precise tragar.

Pra'que eu saia na chuva,
Pra'que eu também saiba a hora de voltar.
- Gabriela Andrade



quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

- Bela

És tão complexa como um labirinto, mais infeliz e insegura do que as coisas mais desconexas. Como um cachorro abandonado num dia chuvoso. Tão encolhida, precisando de um afago, de um elogio sincero... Só querendo ser amada. Ou só precisando de alguém que a enxergue, no canto, apagada.
Possuidora de um potencial enorme, de um querer ser deusa. Deusa plena da beleza empoderada. Em seus olhos tem um desejo de rasgar as vestes, dizer pro mundo o quanto necessita sentir-se bela. Teu potencial é tão absurdamente grande, mas ninguém a estuda, ninguém a incentiva. Então a fazem grão. Um grão no meio do mundo, moído e esquecido. Deixado ao chão para ser reciclado, é assim que ela sente cada passar do dia. Percebe que o mundo é tão grande e ela não é nada além do querer ser. Mas se alguém a dissesse que de fato é... Ah, se dissesse...
Consegue lembrar do quanto desejou um outro alguém, do quanto, um dia, só quisera devorar toda a beleza do ser, quis saber o sabor do prazer. Agora só espera a reciprocidade de um outro alguém, mas não sabe ao menos quem.
Na esperança de um dia ser vista, de um dia ser amada, esquece que tem olhos -mesmo que míopes- e pode enxergar a si, esquece que é possuidora de um sentimentalismo -mesmo que vago- e pode muito bem amar a si.